sábado, 8 de janeiro de 2011

Decisão de Cezar Peluso sobre a libertação de Battisti

Vale uma lida, para discutir independência e harmonia entre os poderes, supremocracia, discricionariedade, competência do Poder Executivo...


DECISÃO: 1.  Invocando decisão do Exmo. Sr. Presidente da República que lhe teria negado a extradição, cujo pedido foi deferido por esta Corte, Cesare Battisti requer que o Tribunal lhe expeça, de imediato, alvará de soltura  (a),  ou,  em via alternativa,  que declare esgotada sua jurisdição, tocando  aos  órgãos  do  Poder  Executivo  a  responsabilidade  pelo cumprimento da decisão presidencial (b).
2. Não encontro, porém, em relação a nenhum de ambos os pedidos sucessivos,  ou alternativos  (a  e b),  não obstante a inegável  urgência da matéria, que envolve questão de liberdade física, o requisito da aparência de  razoabilidade  jurídica  das  pretensões,  o  qual,  sintetizado  na costumeira expressão  fumus  boni  iuris,  justificaria excepcional  cognição ativa desta Presidência, nos termos do art. 13, inc. VIII, do RISTF.
3.  Quanto  ao  segundo  (b),  é,  desde  logo,  óbvio  que,  castrando competência  exclusiva  do 
egrégio  Plenário,  não  seria  lícito  a  esta Presidência declarar exaurida,  no caso,  a jurisdição da Corte,  sobretudo nas perspectivas de questão inerente ao âmbito de execução de acórdão proferido pelo Tribunal Pleno e cuja relatoria toca hoje a outro Ministro.
4. Tampouco deve ser outra a solução ao pedido principal (a). E dou as breves razões desse entendimento, reavivando, de um lado, que,  nos  termos  claros  do  acórdão,  a  Corte  negou toda  legitimidade jurídica  às  causas  fundantes  da  concessão  de  refúgio  ao  então extraditando,  ao  repelir,  por  substantiva  maioria,  as  preliminares correspondentes e, em particular, ao reconhecer a “absoluta ausência de prova de risco atual de perseguição política”, bem como de algum “fato capaz de justificar  receio atual de desrespeito às garantias constitucionais do condenado”.  Ambas  essas  afirmações,  que  resumem e  traduzem largos fundamentos do acórdão, constam de expressões  textuais de uma de suas ementas, precisamente a quarta (cf. fls. 4195).
E, doutro lado, recusou ao Exmo. Sr. Presidente da República, para efeito de efetuar, ou não, a entrega do extraditando, perante o dispositivo final ou comando decisório (iudicium), discricionariedade só proclamada, de modo insuficiente, por quatro dos votos elementares do julgamento. É oportuno,  aliás,  advertir  que,  após longa discussão,  acordou o egrégio

Plenário  extirpar  ao  acórdão  e  à  ata  de  julgamento  a  referência  à discricionariedade,  exatamente porque a não reconheceu como opinião da Corte (cf. fls. 4182-4188).
De nenhum relevo ao propósito a opinião isolada que,  integrando voto,  pudesse  sugerir  liberdade  absoluta  do  Exmo.  Sr.  Presidente  da República  em tema  de  entrega,  ou  não,  do  extraditando,  diante  do inequívoco  teor  do  dispositivo  do  acórdão  que,  expressis  verbis, subordinou  a  legitimidade  do  ato  de  S.  Exª,  uma  vez  decretada  a extradição,  à observância dos  “termos  do  Tratado  celebrado  com o Estado requerente, quanto à entrega do extraditando”. Tal enunciado seria escusável, se não guardasse consequência prática no mundo jurídico.
5. Ora, funda-se o ato concreto do Exmo Sr. Presidente da República -  o qual  agora  negou a entrega  –  em parecer  que,  para  formalizar  a motivação jurídica necessária, recorre à cláusula inserta no art. 3º, inc. 1, alínea  f,  daquele Tratado,  sob alegação de que,  segundo várias notícias jornalísticas que enumera, haveria, na Itália,  “comoção política em favor do encarceramento de Battisti”, enquanto “caldo de cultura justificativo de temores para  com  a  situação  do  extraditando,  que  será  agravada” (fls.  4305).  A fundamentação última do parecer que sustenta o ato está bem  resumida neste excerto:  “153. A condição pessoal do extraditando, agitador político que teria agido nos em (sic) anos difíceis da história italiana, ainda que condenado por crime comum, poderia, salvo engano, provocar reação que poderia, em tese, provocar no extraditando,  algum tipo de  agravamento de sua situação pessoal. Há ponderáveis razões para se supor que o extraditando poderia,  em princípio, sofrer alguma forma de agravamento de sua situação”(fls. 4321).
6.  Como transparece através do dilatado parecer, não deparei, para além das declarações colhidas aos jornais italianos,  com descrição nem menção de nenhum ato ou fato específico e novo, que,  não considerado pelo acórdão,  pudesse representar,  com a nitidez exigida pela natureza singular  e  restrita  deste  juízo  prévio  e  sumário,  razão  ou  “razões ponderáveis  para  supor  que  a  pessoa  reclamada  será  submetida  a  atos  de perseguição e discriminação por motivo de  raça,  religião,  sexo,  nacionalidade, língua, opinião política, condição social ou pessoal; ou que sua situação possa ser agravada  por  um dos  elementos  antes  mencionados” (fls.  4329).  Não tenho como,  nesta  estima superficial,  provisória  e  de  exceção,  ver,  provada, causa convencional autônoma que impusesse libertação imediata do ora requerente. 
7.  De  modo  que,  até  para  não  decepar  competência  do  novo  e eminente Min.  Relator  e  do egrégio Plenário,  no controle  de  eventual cumprimento  ou  descumprimento  do  acórdão  exeqüendo,  com  as conseqüências jurídicas que convenham, não me fica alternativa. 
8.  Do  exposto,  indefiro  os  requerimentos  de  fls.  4243-4244, mantendo por ora a prisão do requerente e, diante da urgência do caso, determinando sejam os autos conclusos incontinenti ao Relator, Exmo. Sr. Min. Gilmar Mendes, que reapreciará os pedidos, se for o caso.

2 comentários:

Tarso disse...

qual sua opinião?

Desiree disse...

A competência é do Presidente, e ponto. Não me parece haver espaço para o controle do mérito desta decisão pelo poder judiciário.