quarta-feira, 21 de setembro de 2011

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19 de setembro de 2011 - 18h40

TSE realiza última audiência pública sobre regras das Eleições 2012



Audiência pública que trata de regras das eleições de 2012. Brasilia/DF 19/09/2011 Foto:Nelson Jr./ASICS/TSE

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) realizou nesta segunda-feira (19) a quarta e última audiência pública para tratar das regras que nortearão as Eleições 2012. Relator das resoluções, o ministro Arnaldo Versiani recebeu de representantes de partidos políticos e instituições sugestões para o aperfeiçoamento da resolução sobre prestação de contas, arrecadação, inclusive por meio de cartão de crédito, e gastos de recursos por partidos, candidatos e comitês financeiros na campanha eleitoral do próximo ano. O ministro informou que o TSE analisará todas as sugestões feitas.

A audiência pública foi presidida pelo ministro Arnaldo Versiani e conduzida pelo secretário-geral da Presidência do TSE, Manoel Carlos de Almeida Neto. Participaram também da mesa do encontro o ministro substituto do TSE Henrique Neves, a vice-procuradora geral eleitoral, Sandra Cureau, e os assessores especiais da Presidência da Corte Luís Gustavo Maciel e Cybele Caldeira Macedo.

Depois de receber sugestões e debatê-las, o ministro Arnaldo Versiani destacou a importância de se cumprirem dois “ideais” no processo de prestação de contas. “O que nós queremos é fazer com que haja a conciliação entre dois ideais: o rigor da prestação de contas e também fazer com que os candidatos não sejam penalizados ou punidos por um eventual deslize, um erro formal que não contamine, de modo nenhum, o conteúdo da prestação de contas”, concluiu.

O ministro Henrique Neves, por sua vez, que também participou de todas as audiências públicas, salientou que todas as sugestões recebidas são muito pertinentes e ressaltou que todas elas serão analisadas. O ministro falou ainda sobre o que considera o mais importante no processo de prestação de contas. “O principal ponto de uma prestação de contas não é cassar mandatos, não é aplicar multas, é manter a transparência”, disse.

As audiências públicas promovidas pela Corte tiveram como objetivo receber e debater as sugestões dos partidos políticos e da sociedade em geral, buscando a consolidação das regras das eleições de maneira democrática e em conformidade com a legislação eleitoral.

Depois de ouvir os delegados ou representantes dos partidos políticos nas audiências públicas, o TSE pode, até o dia 5 de março do ano da eleição – atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas na Lei nº 9.504/1997 –, expedir todas as instruções necessárias para a fiel execução do pleito. No entanto, a intenção do presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski, é aprovar até o final deste ano todas as resoluções para as Eleições 2012.

Sugestões

Na quarta e última audiência pública sobre as resoluções das Eleições 2012, o coordenador do Núcleo Eleitoral do Ministério Público Eleitoral da Bahia, José Ferreira de Souza, solicitou esclarecimento sobre o prazo de entrada de ação com base em arrecadação ou gasto irregular em campanha eleitoral. O ministro Arnaldo Versiani informou que o prazo fixado pela legislação vai até 15 dias após a diplomação do candidato eleito.

Já o delegado nacional do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) Bruno Alves pediu que fosse fixada na resolução a exclusão da atividade voluntária, pessoal e direta de militante como doação estimável em dinheiro, que deve ser declarada na prestação de contas. O secretário-geral do Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral (Ibrade), Gustavo Severo, aderiu integralmente à manifestação do representante do partido e ressaltou a importância de se observar o princípio da razoabilidade na prestação de contas.

Segundo o delegado do PSTU, muitos militantes da legenda respondem a ações eleitorais por terem se engajado voluntariamente em campanhas passadas do partido, em ações como panfletagem, diagramação de determinado panfleto, cessão de veículo pessoal em algum momento, entre outras, que não chegaram a ser contabilizadas pela legenda.

“Isso está limitando a ação do militante, daquele pessoal que verdadeiramente faz a campanha. A atividade voluntária do militante em favor de um partido não pode ser cerceada pela legislação. Queremos que essa atividade não seja objeto de contabilização eleitoral”, ressaltou Bruno Alves.

O representante do Instituto José Luiz e Rosa Sundermann, Fernando Castelo Branco, que faz um trabalho junto ao PSTU, reforçou a posição do partido afirmando que é uma medida de justiça, favorável à democracia, a retirada da atividade voluntária e pessoal de militante da necessidade de contabilização na prestação de contas.

O ministro Arnaldo Versiani lembrou que a Justiça Eleitoral está atenta ao problema e que o próprio Ministério Público Eleitoral passou a não mais cogitar de propor ação contra pessoa física, que fez algum tipo de atividade voluntária de pequena monta a partido, mas que não obteve renda no ano anterior à eleição ou obteve uma renda ínfima, inferior ao limite legal, por exemplo, do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).

Já os promotores de Justiça do Ministério Público de São Paulo e do Rio de Janeiro Valcir Paulo Kobori e Alessandra Celente, respectivamente, se manifestaram em favor do rigor na apresentação das prestações de contas.
“Prestar contas é dever do candidato com a transparência, com a lisura do processo eleitoral”, disse Alessandra Celente.

Ela defendeu que a Justiça Eleitoral reforce nas Eleições 2012, além da sanção administrativa ao candidato que não prestar contas, o aspecto da sanção criminal (crime de desobediência, artigo 347, do Código Eleitoral) ao candidato que, intimado a apresentar suas contas de campanha, não o fizer.

O conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Luiz Viana Queiroz, representando o presidente da Ordem, Ophir Cavalcante, entregou ao ministro Arnaldo Versiani cópia da inicial e do parecer acerca da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4650.

A ação, apresentada no início deste mês no Supremo Tribunal Federal, pede que sejam declarados inconstitucionais dispositivos da legislação eleitoral que autorizam doações de empresas a candidatos e a partidos políticos. Na ADI, o Conselho Federal da OAB também solicita que seja estabelecido um limite para as doações feitas por pessoas físicas.

Rigor

O ministro Arnaldo Versiani afirmou que a Justiça Eleitoral será rigorosa na fiscalização do conteúdo das prestações de contas das Eleições 2012, embora possa ser tolerante em aspectos formais de importância mais reduzida nas contas, mas que, às vezes, chegam a levar à própria rejeição das contas, o que não deveria ser o caso. “Não seremos, de forma alguma, menos rigorosos do que fomos nas eleições passadas na verificação das prestações de contas”, destacou o ministro Arnaldo Versiani.

Por sua vez, a representante do Partido dos Trabalhadores (PT) Antônia Vanda reafirmou a necessidade de que as doações recebidas por partido ou candidato de fontes vedadas pela legislação eleitoral sejam transferidas para o Tesouro Nacional.

A vice-procuradora geral eleitoral, Sandra Cureau, disse estar preocupada com o tema. Ela teme que eventualmente alguns candidatos possam “querer arriscar” nas Eleições 2012 com o recebimento de recursos de fontes vedadas pela legislação eleitoral. “Ou seja, se a fonte vedada for descoberta, só então ela teria de transferir os recursos ao Tesouro Nacional. É preciso que tenhamos atenção a isso”, disse Sandra Cureau. 

O ministro Arnaldo Versiani informou que o partido ou candidato deverá transferir ao Tesouro Nacional as doações recebidas de fontes vedadas no prazo de cinco dias a contar da decisão de julgamento das contas. O ministro lembrou que nada impede, porém, que o partido ou candidato transfira, neste prazo, para o Tesouro Nacional recursos de fontes vedadas em campanha eleitoral assim que recebam tais doações.    

Audiências anteriores

As três primeiras audiências, realizadas em agosto, debateram as resoluções sobre os seguintes temas: atos preparatórios; propaganda eleitoral; condutas vedadas; representações; assinatura digital do sistema; cédulas de contingência; formulários e lacres para as urnas eletrônicas; pesquisas eleitorais; apuração dos crimes eleitorais; escolha e registro de candidatos; recepção de votos; garantias eleitorais; justificativa eleitoral; totalização e proclamação dos resultados; e diplomação.

As minutas das resoluções já estão disponíveis no site do TSE (clique aqui).

EM/LC

Leia mais:

31/08/2011 - TSE recebe sugestões sobre propaganda eleitoral nas Eleições 2012

17/08/2011 - Partidos e instituições apresentam sugestões para as Eleições 2012

10/08/2011 - TSE recebe sugestões sobre cinco resoluções das Eleições 2012

domingo, 18 de setembro de 2011

Direitos fundamentais e Administração Pública

É possível vislumbrar duas aproximações ao tema direitos fundamentais e Administração Pública. Afirma-se que a 1) Administração Pública deve respeitar os direitos fundamentais; e que 2) a Administração Pública deve efetivar os direitos fundamentais.
1. O primeiro enfoque está diretamente relacionado com a acepção contemporânea de Estado. Não é concebível hoje a instituição de um Estado e a organização de seus órgãos de soberania sem o respeito aos direitos fundamentais. Esses são vistos como elementos essenciais da concepção de Estado de Direito, e passam a ser critérios de legitimação do poder político.
Todos os órgãos de soberania são, assim, informados pelos direitos fundamentais. Em relação à Administração Pública, vista como veículo da expressão de valores e preferências dos cidadãos (como a vê Jocelyn Bourgon), ou como realizadora do interesse público, como é possível retirar da Constituição, o respeito aos direitos fundamentais é ainda mais necessário.
Apenas para pontuar, vejo que o interesse público, se concebido adequadamente, não se contrapõe aos direitos fundamentais. Tomado o artigo 3º da Constituição, me parece que apenas com uma visão inconstitucionalmente individualista é possível ver uma contraposição entre esses valores. Penso que seja sempre necessário estabelecer o que se compreende por interesse público e intuo que as divergências neste ponto sejam mais terminológicas que ontológicas.
Não há uma identificação total entre interesse público e interesses particulares, e tampouco há um interesse público transcendente aos interesses privados (DH, 58). A noção de interesse público extraível da Constituição implica o respeito e a consideração dos indivíduos, de seus direitos e de seus interesses, mas informado pelo princípio da igualdade e da solidariedade, para cumprir as tarefas estatais.
Esse ponto poderia ser considerado o mais pacífico da relação entre Administração Pública e direitos fundamentais. No entanto, infelizmente, ainda permanecem nas estruturas pouco burocráticas resquícios (ou mais que resíduos) de um pensamento personalista e anti-republicano. No que se refere, especificamente, ao respeito a um direito fundamental previsto no artigo 5º da Constituição (inciso 34, alínea a), a Administração Pública está em franco débito. Não se leva a série o direito de petição, ainda que se refira a informações de caráter evidentemente público e que serviriam para garantir a transparência da gestão da coisa pública.
2. O segundo enfoque que se pode dar é aquele que diz respeito ao papel da Administração Pública na efetivação dos direitos fundamentais. Em um Estado, como o brasileiro, fortemente informado por direitos prestacionais, a Administração atua como instrumento de realização da finalidade do Estado.
Sua atuação garante os direitos de liberdade e propriedade, com a existência de aparatos de segurança pública e de poder de polícia, para proteger e regular esses direitos. Os direitos políticos, para sua efetivação, também exigem uma administração das eleições, que organize o cadastro eleitoral, convoque e treine mesários, disponibilize as urnas eletrônicas, faça o registro de candidatos, registre partidos e assegure o gozo de suas garantias fundamentais.
Em uma visão mais ampla dos direitos políticos, na visão de participação do cidadão na administração da coisa pública de Clèmerson Merlin Clève, o cidadão propriamente participante também exige uma atuação da Administração Pública, com a organização de audiências públicas e de conselhos.
O grande desafio da Administração Pública neste ponto é em relação aos direitos sociais, à efetivação das promessas de democracia social do Estado brasileiro. A existência desses direitos com sede constitucional e revestidos de fundamentalidade impõe a prestação de serviços públicos e a implementação de políticas públicas. A busca pela realização de objetivos socialmente relevantes e determinados política e juridicamente tem como base a prestação de serviços fundamentais (Dallari Bucci, Breus, p. 185).
Ainda há outra implicação com os direitos fundamentais em relação às políticas públicas. Sua formulação deve passar por uma ampla discussão social, com a participação dos diversos setores da sociedade (Vanice, aula). Para a identificação das alternativas de solução e para a formulação da política pública exige-se a interlocução da Administração Pública com a sociedade, exige-se um processo decisório democrático e republicano.
3. Para além destes dois enfoques, penso que atualmente faz-se necessário tratar da relação entre direitos fundamentais e Administração Pública de mais uma maneira. Um outro ponto de vista que não substitui ou supera os dois anteriores, não se trata de varrer as visões anteriores, mas que se coloca ao lado dos demais. Uma relação que, na verdade, talvez nem seja exatamente esta, mas que, erroneamente, assim se compreende.
Em relação aos agentes públicos, e aqui começo a tatear, a intuir, penso que esse binômio do qual estamos tratando aqui exige um olhar ainda mais republicano do que as anteriores. Em relação aos seus agentes, a postura da Administração Pública e o desenho constitucional deve ir além de uma matriz individualista. Deve ser considerada sob outro prisma.
Antecipo as ressalvas, pois tenho consciência que sem a fundamentação necessária esse discurso pode ser aproximar de uma inadmissível defesa da funcionalização dos direitos fundamentais. Não defendo, de maneira alguma, a instrumentalização dos indivíduos para a realização dos fins do Estado. Não defendo que os agentes do Estado não tem quaisquer direitos fundamentais. Mas não me parece possível considerar simplesmente algumas garantias ou potestades dos agentes públicos como patrimônio individual.
Sei que, como aduz Ignacio de Otto Pardo, o mais problemático da defesa da Constituição em face de condutas lícitas é “la limitación de la libertad individual con exclusión de su uso para determinados fines”. Me parece que, em face das experiências brasileiras e paranaenses contemporâneas, isso, no entanto, se impõe.
Para fundamentar – ou tentar fazê-lo – essa intuição, me apego à ideia de função cunhada por Celso Antonio Bandeira de Mello e da distinção entre direitos públicos e prerrogativas estabelecida por Carlos Ayres Britto. Parto do pressuposto que os agentes públicos exercem função e para isso contam com um conjunto de prerrogativas, que não se incorporam aos indivíduos como os direitos subjetivos.
Possivelmente uma das definições mais repetidas em salas de aula, para Celso Antônio Bandeira de Mello “[e]xiste função quando alguém está investido no dever de satisfazer dadas finalidades em prol do interesse de outrem, necessitando, para tanto, manejar os poderes requeridos para supri-los”.
Celso Antônio promove, republicanamente, a inversão entre direitos e deveres. Inicialmente – e assim se dá quando do exercício de uma função pública – há um dever, um objetivo a ser alcançado, uma tarefa, cuja definição não está ao alcance do agente, mas lhe é anterior. E para a realização deste mister ou encargo, para isso e não para qualquer outra coisa, é que alguns poderes, prerrogativas ou potestades se colocam à disposição do agente público. Desta maneira, há uma inafastável relação de finalidade.
Afirmei antes que esse terceiro ponto de vista não está exatamente relacionado ao binômio Administração Pública e direitos fundamentais. E digo isso baseada na distinção feita por Carlos Ayres Britto entre direitos subjetivos e prerrogativas logo após a entrada em vigor da Constituição de 1988.
Para Carlos Ayres, as prerrogativas se aproximam dos direitos subjetivos, pois são valiosas, pessoalmente fruíveis e passíveis de exigibilidade, mas se afastam daqueles pois não tem seu conteúdo constitucionalmente expresso, tem um âmbito mais reduzido de beneficiários e, o que interessa diretamente ao meu argumento, tem um caráter preponderantemente político-institucional.
Quando estamos diante de prerrogativas, há a ascendência da função. Ou seja, o exercício das prerrogativas justifica-se para o cumprimento de um dever, estabelecido normativamente. Repito, pois isso não é a regra entre nossos administradores: as prerrogativas não servem para o atendimento de interesses individuais ou parciais, ou para a realização de um projeto político pessoal ou partidário.
Com Carlos Ayres, as prerrogativas são direitos especialíssimos, que se destinam a reforçar a possibilidade de realização dos valores constitucionais, são mandamentos especialíssimos de reforço protetivo a valores constitucionais, que habilitam o sujeito para a preservação das instituições. Para o autor, “no cerne de cada prerrogativa constitucional está pressuposta uma atividade pública ou privada de que dependem interesses sociais transbordantes dos interesses privados dos respectivos exercentes, em grau mais acentuado que o verificado na tessitura dos direitos meramente subjetivos”.
O ordenamento jurídico permite essa construção, quando estabelece o estatuto dos congressistas a partir do artigo 53, com uma série de prerrogativas e traz a figura da quebra de decoro para os casos de abusos destas prerrogativas. Assim, há a inviolabilidade civil e penal pelas opiniões, palavras e votos dos parlamentares, mas é hipótese de perda de mandato o procedimento declarado incompatível com o decoro parlamentar.
As prerrogativas dos parlamentares se referem à exigência de ampla liberdade e independência do Parlamento e dos representantes. Respondem a uma finalidade democrática e, para Pinto Ferreira, tem caráter instrumental. Não dizem respeito aos indivíduos que ocupam as funções de parlamentares, mas à função em si. Com Carlos Ayres, o caráter das prerrogativas dos membros do Parlamento tem um caráter eminentemente político-institucional.
Parece razoável deduzir que as prerrogativas que se dirigem aos agentes dos demais órgãos de soberania tenham ontologicamente similares. As garantias do Estatuto da Magistratura, a partir da sua sede constitucional, não podem ser vistas como privilégios de seus titulares, mas como exigências institucionais para permitir o exercício adequado das funções do Poder Judiciário. Fábio Konder Comparato aponta a independência funcional da magistratura como garantia institucional do regime democrático. E é apenas desta forma que é possível compreender tais prerrogativas em um regime republicano.
Em face destas duas ordens de argumentos, em relação ao Poder Legislativo e ao Poder Judiciário, é possível configurar de maneira análoga as prerrogativas dos titulares do Poder Executivo e de seus auxiliares. Todos os poderes reunidos na figura do chefe do Executivo em nosso sistema hiperpresidencialista devem passar também por esse olhar. Devem ser encarados como instrumentos para a realização de tarefas estabelecidas constitucionalmente.
A possibilidade de escolher livremente seus auxiliares bem como de preencher cargos de confiança deve ser submetida a essa máxima. Se os cargos de confiança são aqueles que exigem uma articulação entre o plano político e o plano técnico e que promovem o diálogo entre estas esferas, a competência técnica não pode ser desprezada. A chamada “livre nomeação” não se divorcia do sistema constitucional e dos princípios da Administração Pública. O feixe de prerrogativas serve para o exercício de uma função, e como tal deve ser controlado.
O mesmo pode ser dito em relação à organização do Estado, à atuação política dos agentes públicos. A política não deve ser demonizada, mas tem que parar de ser confundida com o adonamento do Estado, com o aparelhamento de seus setores estratégicos – principalmente os que devem controlar o poder – com aliados. O agente político detentor de mandato eletivo tem liberdade para o seu exercício, entendida como independência de instruções. Não pode, no entanto, ignorar a Constituição, seus valores e princípios.
Essa visão que afasta a confusão entre as prerrogativas e os direitos fundamentais me parece indispensável para a realização da República. Ainda não vislumbro desenhos institucionais para sua promoção, mas tenho certeza da imprescindibilidade do controle cidadão para a mudança, para a construção de uma Administração e de um Estado verdadeiramente democráticos.
Pode parecer frágil, mas, em tempos de redes, vale a lembrança de João Cabral de Melo Neto: “Um galo sozinho não tece uma manhã: /ele precisará sempre de outros galos. /De um que apanhe esse grito que ele/ e o lance a outro; de um outro galo/ que apanhe o grito de um galo antes/ e o lance a outro; e de outros galos/ que com muitos outros galos se cruzem/ os fios de sol de seus gritos de galo,/ para que a manhã, desde uma teia tênue,/ se vá tecendo, entre todos os galos”. 

domingo, 11 de setembro de 2011

Sistema eleitoral no Mercosul, sob a perspectiva do Direito Brasileiro

Para analisar o sistema eleitoral no Mercosul, escolhi tratar rapidamente sobre os sistemas adotados nos demais países para depois tratar do sistema brasileiro e das propostas para o Parlamento do Mercosul. Apenas para esclarecer o tema, sistema eleitoral é a fórmula que traduz a vontade popular em representação política, ou, como afirma José Afonso da Silva “o conjunto de técnicas e procedimentos que se empregam na realização das eleições, destinados a organizar a representação do povo no território nacional”. Penso que a escolha do sistema eleitoral a ser aplicado é uma decisão política fundamental de âmbito constitucional e que influencia a participação popular na formação da vontade política e a organização partidária.
A fórmula eleitoral pode ser majoritária (em que são eleitos os candidatos que alcançarem o maior número de votos) ou proporcional (que leva em consideração os votos dados ao partido ou coligação e os atribuídos a outros candidatos sob a mesma legenda para determinar os eleitos).  Quando há a adoção do princípio majoritário para a eleição do Parlamento com a divisão em distritos da circunscrição, fala-se em sistema distrital. No Brasil, adota-se o princípio proporcional para a formação das casas parlamentares, com exceção do Senado Federal.
O sistema proporcional pode ser de listas fechadas e hierarquizadas (nas quais a ordem dos candidatos a preencherem as vagas obtidas pelos partidos é definida anteriormente pelos próprios partidos) e de listas abertas – ou, tecnicamente, em face do monopólio dos partidos para o registro de candidatos, listas fechadas, mas não hierarquizadas – em que é permitido ao eleitor estabelecer quais candidatos de cada partido serão eleitos.
Jairo Nicolau evidencia as preocupações do sistema proporcional: “a) assegurar que a diversidade de opiniões de uma sociedade esteja refletida no Parlamento; e b) garantir eqüidade matemática entre os votos dos eleitores e a representação parlamentar”. José Joaquim Gomes Canotilho ressalta que o sistema proporcional invoca a igualdade material (ao atender à exigência de voto igual), a adequação à democracia partidária e a representação de todos os grupos sociais.
Os opositores do sistema proporcional defendem a superioridade das vantagens do princípio majoritário, como o favorecimento da governabilidade, a estabilidade dos governos, capacidade de ação, a tendência ao bipartidarismo ao impossibilitar, na prática, a sobrevivência de pequenos partidos e a formação de uma oposição consistente.
Bem, falemos agora do Parlamento do Mercosul, “órgão de representação dos cidadãos” do Estados-membros do bloco, sediado em Montevidéu, é formado por representantes do Brasil, da Argentina, do Paraguai e do Uruguai. Sua constituição se deu em dezembro de 2006, com uma sessão de abertura no Senado Federal, com a presença do então presidente Lula.
Não há atuação legislativa propriamente dita do Parlamento do Mercosul, mas há de se ressaltar que a função de um parlamento não se resume à elaboração de normas legais. A função de fiscalização – a mais relevante, para John Stuart Mill – está fortemente presente entre a competência do Parlasul, tanto quando da verificação em relação à observância das normas, como a elaboração de informes sobre direitos humanos, como o recebimento de informações dos órgãos decisórios e consultivos e, ainda, sobre a execução do orçamento da secretaria do Mercosul. Em uma ação mais próxima ao que usualmente se espera dos parlamentos, o Parlasul elabora ditames sobre os projetos de normas do Mercosul e estudos e projetos de normas nacionais.
O Parlamento do Mercosul, em face das distintas configurações populacionais dos países que formam o bloco, a representação – embora relacionada aos cidadãos e não aos Estados – conta com uma proporcionalidade atenuada, e que foi sendo modificada no tempo. De uma representação idêntica a todos os Estados, o Brasil passou (ou deveria ter passado) a 37 parlamentares na legislatura 2011-2014, a Argentina a 26, e o Paraguai e o Uruguai a 18. Para a legislatura 2015-2018 são previstos 75 parlamentares brasileiro, 43 argentinos, 18 paraguaios e 18 uruguaios.
Exige-se, pelo protocolo e segundo o regimento interno do Parlamento do Mercosul, a eleição por sufrágio direto, universal e secreto dos cidadãos dos Estados Parte (art. 7).  O mandato é de quatro anos e se permite a reeleição (art. 12). Há proibição expressa de mandato imperativo e garantia de independência no exercício da função (art. 13). O protocolo de Montevidéu estabelece que, para além da exigência do sufrágio direto, universal e secreto dos cidadãos, a eleição se regerá pelo previsto na legislação de cada Estado Parte, desde que assegurem adequada representação por gênero, etnias e regiões. Há previsão de suplentes, eleitos da mesma forma e de um “Dia do Mercosul Cidadão”, para a eleição simultânea dos parlamentares em todos os Estados Partes.
O Paraguai realizou eleição direta para parlamentares do Mercosul em abril de 2008, em que concorreram 20 lemas, em eleição conjunta com a escolha de presidente, governadores, senadores e deputados. A Resolução nº 55/2007 do Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, que convoca as eleições, estabeleceu os cargos a serem eleitos, entre eles 18 parlamentares titulares e 18 parlamentares suplentes do Mercosul, que concorreram em uma circunscrição única, como os senadores. O sistema eleitoral adotado é o informado pelo princípio proporcional, de lista fechada (e bloqueada). O Código Eleitoral paraguaio (Lei nº 834/96) prevê, ao tratar das eleições em geral, a presença de pelo menos uma mulher a cada cinco lugares das listas partidárias, mas pelas candidaturas ao Parlasul apresentadas no site do TSJE nem todos os partidos ou lemas seguiram esta regra, embora a maioria o tenha feito, o que permitiu que a representação paraguaia fosse composta por algumas mulheres. Cinco lemas conseguiram eleger parlamentares ao Parlasul no Paraguai.
No Uruguai, ainda não houve eleição direta para o Parlamento do Mercosul, em virtude de dificuldades na definição do sistema eleitoral. O sistema eleitoral uruguaio para a formação das casas parlamentares é fundamentado no princípio proporcional, com a apresentação dos candidatos pelos partidos em listas fechadas (lemas). A eleição para o Senado é realizada em circunscrição nacional e para a Assembleia há divisão territorial. Existe ainda a figura dos sublemas, que são divisões dentro dos partidos e que apresentam suas listas: o Uruguai adota desde 1910 o “doble voto simultáneo” que permite que o eleitor vote no partido e escolha, neste partido, os candidatos que mais lhe agradem.
A Argentina ainda não realizou eleições diretas nem conta com a regulamentação destas, ainda que planeje eleger seus parlamentares do Mercosul neste ou no próximo ano. São várias as propostas apresentadas, que divergem predominantemente em relação à circunscrição a ser considerada. Todas convergem, no entanto, pela adoção do sistema proporcional, de listas fechadas e bloqueadas, sistema adotado para as eleições argentinas. O Código Eleitoral argentino exige a apresentação de 30% de mulheres “y en proporciones com posibilidad de resultar electas” (art. 60, 3).
Encontrei dois projetos de lei sobre o assunto, ambos iniciados no Senado argentino. O primeiro (S-2555/2010), encabeçado por Adolfo Rodríguez Saa, estabelece a eleição por distritos, coincidentes com as Províncias e a Cidade Autônoma de Buenos Aires. Cada distrito votaria em uma lista com dois titulares e dois suplentes e se aplicaria – alegadamente – o método proporcional D’Hont. Para a definição dos eleitos, os primeiros 24 lugares seriam ocupados pelo primeiro candidato da lista que em cada distrito tenha obtido a maior quantidade de votos válidos. As demais, ocupadas pelos candidatos eleitos em segundo lugar, de acordo com a quantidade de votos obtidos. Este projeto, que prevê a primeira eleição em 2011, está na Comissão de Assuntos Constitucionais desde 19 de agosto de 2010.
O outro projeto (S-4005/2010), apresentado por Elida Vigo, prevê que as listas devem ser alternadas em relação ao gênero e que o candidato a titular e o candidato a suplente, em cada lugar na lista, não podem ser do mesmo sexo. Não são permitidos dois candidatos titulares do mesmo distrito eleitoral. Segundo essa proposta, 24 parlamentares seriam eleitos por distritos (divididos como no projeto anterior, mas que cujas listas apresentariam apenas um candidato e um suplente) e os demais pelo sistema proporcional em uma circunscrição nacional. Adotaria-se, portanto, um sistema misto. Cada lista poderá apresentar quantos candidatos forem as cadeiras a serem preenchidas. O projeto também está na Comissão de Assuntos Constitucionais, desde 15 de novembro de 2010, e também prevê eleições este ano.
No Brasil, tampouco houve definição a respeito da eleição direta para os parlamentares do Mercosul. Aqui parece que as divergências são ainda mais acirradas, pois sequer os representantes brasileiros para esse período foram indicados, depois de um impasse sobre a recondução de membros anteriores. Há informações no site do Parlasul que os representantes indicados tomarão posse em 31 de agosto.
Os projetos que encontrei trazem sistemas eleitorais não contemplados pela legislação brasileira atual. Na Câmara de Deputados, pretendendo eleições diretas em 2010, Carlos Zarattini apresentou uma proposta (PL 5279/09) de eleição em circunscrição nacional e com a adoção do sistema proporcional, com listas fechadas e bloqueadas. Prevê a apresentação de lista de candidatos que corresponda até 150% do número de lugares a preencher e que os “candidatos com domicílio eleitoral nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul ocuparão, em cada lista, vagas na proporção dos lugares que o conjunto de estados que compõe a região ocupa na Câmara dos Deputados”, além da cota de gênero de 30%. Na tramitação deste projeto foi aprovado na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional substitutivo apresentado pelo Dr. Rosinha.
O texto aprovado pela Comissão mantém a proporcionalidade pura com lista fechada em circunscrição nacional, mas aperfeiçoa o cumprimento da exigência de representatividade de gênero e regiões, ao reservar nas listas partidárias, nos dois primeiros conjuntos de cinco nomes, vagas para pelo menos duas mulheres e, necessariamente, a participação de representantes das cinco regiões. Há previsão de financiamento público exclusivo (com recursos equivalentes a 5% do Fundo Partidário) e tem disposições sobre o horário eleitoral gratuito para a disputa. Não admite coligações partidárias. O substitutivo prevê eleições em 2014, simultaneamente às eleições gerais.
No Senado, a proposta apresentada por Lindbergh Farias (PLS 126/2011), que quer que a escolha ocorra conjuntamente com as eleições municipais em 2012, prevê um sistema misto. Vinte e sete parlamentares seriam eleitos pelo voto majoritário, um por Estado e mais o Distrito Federal. Os quarenta e oito restantes seriam eleitos proporcionalmente, em listas fechadas e bloqueadas, e em âmbito estadual. Há previsão de cota de 30% para cada sexo, sem discriminar a ordem, e que determina que “a preordenação das listas de Representantes Federais cabe as direções nacionais dos respectivos partidos e coligações”.  As campanhas serão realizadas sob a responsabilidade dos diretórios nacionais, com recursos exclusivamente públicos. Embora o sistema apresentado traga a representação proporcional, o fato de 15 Estados e do Distrito Federal elegerem apenas um representante por este sistema e sete Estados elegerem dois, e por listas fechadas e bloqueadas, revela que esta proporcionalidade não é efetiva. O projeto encontra-se na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, desde 30 de março de 2011 e depois deve seguir para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Após a descrição dos projetos existentes, passa-se a avaliá-las em face dos princípios constitucionais estruturantes do nosso Direito Eleitoral.
Em termos de igualdade de resultados, exigência das democracias contemporâneas mais ambiciosas, impõe-se a necessária participação das minorias no debate público e nas instituições políticas. Assim também o faz o desenho constitucional da democracia brasileira, a partir do ideal republicano e da exigência de tratamento com igual consideração e respeito de todos os cidadãos. O pluralismo político, fundamento da República brasileira, deve aplicar-se também às eleições do Parlamento do Mercosul. Neste sentido, a adoção do sistema proporcional responde à exigência de igualdade eleitoral e seu afastamento pelo princípio majoritário contraria frontalmente a democracia e o constitucionalismo brasileiros.
A partir desta premissa, vislumbra-se a inconstitucionalidade do projeto apresentado pelo senador Lindbergh Farias. Ainda que o projeto, como foi dito, afirme a adoção de um sistema misto, que combina o princípio majoritário com o princípio proporcional, trata-se, na verdade, de um sistema quase que exclusivamente majoritário em face do número de cadeiras a serem preenchidas (com possível exceção dos Estados que contariam com mais representantes). A negação do princípio proporcional na formação das casas legislativas – qualquer delas – é incompatível com os princípios constitucionais estruturais do Direito Eleitoral, marcadamente o princípio da autenticidade eleitoral (tanto em relação ao voto como quanto à fidedignidade da representação política) e o princípio da necessária participação das minorias. Há que se verificar, ainda, de que forma pretende-se que a simples previsão de cotas de gênero preencha as exigências do pluralismo. A possibilidade de coligações para a eleição – com a adoção de listas fechadas e bloqueadas – permite a união de partidos com ideologias (ao menos nominalmente) muito diversas e pode proporcionar o desvio na vontade do eleitor.
O substitutivo do Dep. Dr. Rosinha ao projeto do Dep. Carlos Zarattini, ao contrário, contempla amplamente o princípio proporcional, com a adoção da circunscrição nacional. Em uma visão desde a ciência política, José Antônio Giusti Tavares afirma que a representação proporcional integral em colégio eleitoral nacional único está no extremo da perfeita proporcionalidade, o que leva à máxima realização do princípio da igualdade eleitoral.
Algumas críticas que se poderia fazer à adoção desta não divisão do território, em relação ao possível monopólio de representantes de uma região e ao elevado custo das campanhas, são afastadas pelo substitutivo, com a previsão de regras para a composição das listas e de financiamento público exclusivo. Não avança, no entanto, em uma divisão mais democrática e mais pluralista do fundo partidário, pois remete à divisão da Lei dos Partidos, que, combinada com a proibição de financiamento privado, tende a fortalecer os grandes partidos e impedir a representação das menores agremiações. Além disso, há que se apontar que a proibição absoluta de contribuições de pessoas físicas – de pessoas físicas, mas não de pessoas jurídicas – desafia uma análise em relação à sua constitucionalidade. Intuo que a faculdade de contribuir para que um partido possa desenvolver seu programa político (em Parlamentos nacionais ou supranacionais) configura uma dimensão de autonomia pessoal que não pode ser negada pelo legislador.
Ambas as propostas determinam a eleição por listas fechadas (e bloqueadas). Embora essa proposta seja coerente com a adoção do financiamento público exclusivo, e no caso do projeto discutido na Câmara, com a circunscrição nacional combinada com regras para a determinação da ordem na lista, a eleição por lista fechada restringe a escolha democrática do eleitor.
Seus defensores apontam o necessário fortalecimento dos partidos políticos, o custo das campanhas e a existência de disputas entre os candidatos da mesma legenda como motivos para a mudança. José Joaquim Gomes Canotilho, ainda, afirma que a votação em lista fechada não ofende o princípio da imediaticidade do voto.
No entanto, as listas fechadas retiram do eleitor, do soberano, a possibilidade de escolher os seus representantes diretamente. Já existe um filtro partidário na formação da relação de representação: somente podem ser candidatos aqueles previamente escolhidos pelos partidos políticos em convenção. Ainda que não haja clara ofensa aos princípios constitucionais, esse modelo não é o que mais se harmoniza com o desenho da democracia brasileira.
A proposta do senador Lindbergh é ainda mais sensível ao reservar aos diretórios nacionais dos partidos políticos a escolha da ordem dos candidatos nas listas, o que favorece de maneira ainda mais acentuada as oligarquias partidárias, marcando uma redução da competição democrática, como acentua Wanderley Guilherme dos Santos.
Em contrapartida, o projeto da Câmara combina a exigência pouco democrática da lista fechada com regras adequadas para a sua composição que, se não asseguram a democracia interna nos partidos, ainda um desafio para a nossa democracia com partidos, ao menos garantem o respeito à adequada representação por gênero e regiões. Interessante a consideração dos dois primeiros conjuntos de cinco posições para determinar o respeito às cotas de gênero e à representatividade das regiões.
Imagino que não seja, por enquanto, o caso de tentarmos evitar a fraude que ocorre em outros sistemas que adotam a lista fechada com cotas de gênero, com a renúncia após a eleição das parlamentares mulheres para que assumam seus cargos correligionários homens. Imagino. No entanto, não custa minimizar o risco dos partidos escolherem puxadores de votos para as primeiras posições que depois se afastam para que ilustres desconhecidos ou indesejados assumam seus postos. Talvez contribuísse para tanto não permitir a apresentação de mais candidatos que o número de cadeiras a ocupar.
Finalmente, há quem defenda a unificação das regras para a eleição dos parlamentares nos países parte do Mercosul. Não me parece adequado. Cada Estado tem uma realidade política e partidária distinta, além de adotarem distintas formas de Estado. Além disso, essa escolha diminuiria o espaço de deliberação democrática e de participação cidadã nesta discussão. Esta participação, indispensável para a legitimidade do sistema e da atuação dos representantes, é o grande desafio.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Los equivocados rumbos de la reforma política en Brasil: el partido político en contra de la representación política y ambos en contra de la democracia


El sistema político y electoral brasileño está en la agenda de debate desde el Imperio. Nunca hubo satisfacción con las reglas electorales, que siempre se mostraran insuficientes ante la ingeniaría de fraudes en la formación, la manifestación y el escrutinio del voto. Las distintas normativas se sucedían (y se suceden) sin una lógica lineal, siempre respondiendo a necesidades fácticas o intereses políticos parciales.
Ante el principio de la legalidad específica en materia electoral, los derechos políticos y las formas de su ejercicio son materias absolutamente reservadas al Parlamento. Así, hay, antes de la manifestación política de los ciudadanos, la necesidad de una discusión parlamentaria para la definición del diseño de las reglas del juego electoral. Su fundamentación pública y transparente y su construcción democrática son esenciales para la legitimidad de las restricciones que traen para el ámbito de los derechos fundamentales.
El principal problema en términos de reforma política, sin embargo, está en los tiempos del Parlamento y su interés inmediato en la legislación. Las reglas electorales suelen imponer obstáculos a los candidatos y a los partidos; los parlamentos, formados por políticos y partidos, naturalmente se muestran titubeantes en cambiar las reglas que les han hecho vencedores.
Pero hay que se rechazar, de plano, el intento de, en nombre de la dificultad de alcanzar el consenso necesario para aprobar los cambios que se consideran indispensables para una democracia legítima, convocar a una asamblea constituyente exclusiva para discutir los derechos políticos, la regulación de los partidos políticos, de las elecciones y de los mandatos. Este propósito configura un verdadero quebranto de la Constitución, al ofender la regulación de su reforma, con su rito, sus límites y sus exigencias.
Voy a hacer aquí el análisis de las sugerencias de reforma política en Brasil ante el orden constitucional. La primera, la supresión de la posibilidad de reelección en el Poder Ejecutivo me parece recuperar el alcance del principio de la máxima igualdad en la contienda electoral, marca distintiva de la República brasileña.
También es posible situar aquí, junto a la exigencia de autenticidad, la prohibición de las coaliciones en las elecciones que adoptan el sistema proporcional para la distribución de los escaños. O, al menos, la imposición de la distribución de los escaños de manera proporcional a la fuerza de cada partido, para impedir la transferencia de votos entre asociaciones políticas, muchas veces – nominalmente – opuestas.
Otras sugerencias demandan un análisis más pragmático. Sin ofender ni contemplar directamente los principios constitucionales, deben ser examinadas por los efectos que pueden producir. En esta clase están la quiebra de la obligatoriedad del voto, el aumento del tiempo de los mandatos y la elección simultánea para todos los cargos. Aunque mi opinión sobre esas posibilidades sea negativa, no me parece posible declarar su inconstitucionalidad.
Uno de los cambios más buscados por la reforma política se dirige al sistema electoral. El sistema proporcional está en vigor en Brasil desde 1932 y es el sistema que más se armoniza con el principio constitucional de la necesaria participación de las minorías en el debate público y en las instituciones políticas.
El pluralismo político es uno de los fundamentos de la República brasileña. Para encontrar resonancia en las instituciones políticas – esencialmente representativas – es necesario que el sistema electoral permita la representación de las diversas formas de pensar existentes en la sociedad.
La sustitución del principio proporcional por el principio mayoritario, con el acogimiento del sistema distrital, hiere a la Constitución en sus principios básicos. En el sistema distrital no hay espacio para la representación de las minorías, o que contraría toda la preocupación de despejar en el Parlamento – lugar privilegiado de la formación de la voluntad política – las diversas concepciones de Estado y de bien vivir presentes en la sociedad.
Adoptar el principio mayoritario para la elección de todos los parlamentarios es renunciar a la conquista del espacio de disenso cualificado por la coexistencia, dentro de las reglas del juego democrático y con actuación efectiva, de partidos políticos que representan – al menos nominalmente – un amplio abanico de ideologías.
El sistema distrital mixto igualmente está en la agenda de la reforma política en Brasil. La idea es combinar las ventajas de los dos principios, con garantía de la representatividad de las minorías y también de la gobernabilidad.
La propuesta en discusión reduce la proporcionalidad de la representación política, elevando el número de votos necesarios para que un partido pueda ser parte del parlamento, y así aminora el conjunto de ideologías. Asimismo, produce dos categorías de parlamentarios, que pueden representar intereses distintos y confundir a los electores.
El principal partido político nacional hoy – el Partido dos Trabalhadores, de la presidente de la República – defiende como virtud del sistema electoral la proporcionalidad. Pero, en nombre de un necesario fortalecimiento de los partidos, sostiene la adopción del voto en lista.
El presente sistema brasileño es considerado de lista abierta (o mejor, de voto preferente), al permitir que el elector decida sobre cuales candidatos presentados por los partidos serán electos. No parece adecuada a la realidad brasileña la propuesta de adopción de listas cerradas.
Sus defensores apuntan el necesario fortalecimiento de los partidos políticos, el costo de las campañas y la existencia de disputas entre los candidatos del mismo partido o coalición como motivos para la mudanza.
Sin embargo, las listas cerradas retiran del elector, del soberano, la posibilidad de escoger a sus representantes directamente. Ya existe un filtro partidario en la formación de la relación de representación, ante el monopolio de los partidos para el registro de candidatos. Las listas cerradas y jerarquizadas afectan a la libertad de sufragio desde la perspectiva subjetiva del elector.
La democracia interna en los partidos es todavía un reto para los ordenamientos jurídicos. Nuestra historia política apunta para un probable fortalecimiento de las oligarquías partidarias con el acogimiento de las listas cerradas. Una proposición en contra de la democracia.
Los beneficios del acogimiento de la propuesta de la votación en lista no parecen compensar los desvíos que ocasionaría. Limitar el número de candidatos que un partido puede presentar es una forma de reducir la disputa entre los candidatos de la misma asociación y disminuir el costo de las campañas, sin que se retire del elector la plena selección de aquellos que irán representarlo.
Repito: el sistema proporcional con listas abiertas para la elección de diputados y concejales traduce de manera lo más legítima posible la heterogeneidad de la sociedad brasileña y el proyecto democrático inscrito en la Constitución de 1988, que contempla el principio constitucional de la necesaria participación de las minorías en el debate público y en las instituciones políticas.
Hay otra proposición que se refiere al sistema partidario y que busca, por medio de ley, restringir el número de partidos políticos en Brasil: la incorporación de una cláusula de desempeño. Con un argumento centrado en la estabilidad política, y no en exigencias democráticas, intentase limitar el número de los agentes políticos con poder de veto y, de esta forma, reducir el espacio de pluralidad en la definición de la voluntad política.
La inadmisibilidad de una cláusula de barrera se evidencia ante el derecho de oposición y el principio de la necesaria participación de las minorías. Ante esos fundamentos, cualquier cláusula de exclusión u otro artificio reductor del principio del pluralismo partidario son inconcebibles. La limitación del “direito de representação de minorias no Legislativo” hiere al pluralismo político.
Ni la adopción de una cláusula así, ni aquellas proposiciones que la reflejan indirectamente por la división del financiamiento público o dela acceso al radio o a la televisión parecen encontrar eco en el sistema constitucional. La exclusión, directa o postergada, como una lenta exterminación, de los partidos políticos menos expresivos, contraría frontalmente el sistema proporcional, la representación de las minorías y el principio de la democracia deliberativa. No hay “igual consideración y respeto” cuando, abajo de un porcentaje de votos determinado, los partidos y los mandatarios pasan a ser tratados como de segunda categoría.
La adopción de una cláusula de barrera se revela, así, como una alteración defendida por los partidos (o algunos de ellos) en contra de la representación política y en contra de la democracia.
Otro tema que está en la agenda de discusiones de la eterna reforma es el financiamiento de los partidos políticos. Brasil adopta el modelo mixto de financiamiento de los partidos políticos, pero se propone la adopción del financiamiento público exclusivo para las campañas electorales, con aumento del aporte financiero del Estado.
Las propuestas ofrecidas, no obstante, mantienen la presente forma de distribución del fondo: 5% por igual a los partidos registrados y 95% en la proporción de los votos obtenidos en la última elección para la Cámara de Diputados.
La división del fondo partidario no puede configurar una cláusula de diferenciación o un premio al poder. Ha de ser hecha bajo criterios razonables, establecidos por la representación política, sin ofensa al principio constitucional de la máxima igualdad en la contienda electoral y al principio constitucional de la necesaria participación de las minorías en las instituciones políticas y en el debate público.
Además de la exigencia de una fiscalización bastante esmerada, bajo pena de su inocuidad, la adopción del financiamiento público exclusivo, con la distribución de recursos vinculada al desempeño electoral o a la representatividad parlamentaria, ofende el derecho de oposición, al impedir – en la práctica – la obtención de representación por los partidos menores.
Si bien es comprensible la exigencia de la igualdad para la efectividad de la democracia en su ideal más ambicioso, me parece que la prohibición absoluta al financiamiento privado de partidos y candidatos por personas físicas o naturales, contrasta con la autonomía personal, pilar de los Estados democráticos de Derecho. Este razonamiento, sin embargo, no es extensible a las personas jurídicas o morales.
La problemática debe concentrarse en el control de los recursos y en la identificación de su origen.
Por ende, sin temor a caer en las obscuras sendas del pesimismo, pienso que la reforma deseada por algunos partidos no traerá ningún mejoramiento en el escenario político y electoral. Con más razón eso puede ser dicho de una reforma, de cuyas discusiones el pueblo no participa, y es consultado solamente por encuestas parciales y dirigidas.
O no cambiará nada, siendo no más que un embuste, o actuará en contra de una representación política más verdadera o de una democracia más ambiciosa.
En lugar de trabajar por una reforma política de rasgos inconstitucionales, me parece más saludable para nuestro sistema luchar por el respeto de las leyes y por el refuerzo del control ciudadano de la política.
Pues, como dice el poeta brasileño Carlos Drummond de Andrade, en fin, las leyes no bastan, los lirios no nacen de la ley.