quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Impressões sobre o julgamento da Lei Ficha Suja, parte I - quem olhará por nós?

Aguardado ansiosamente (ao menos por mim), iniciou-se ontem o julgamento das ações de controle de constitucionalidade da Lei Complementar nº 135/2010, a famigerada Lei Ficha Suja, ou Ficha Limpa, dependendo de quem fala.
O Ministro Luiz Fux, relator, manifestou-se pela improcedência do pedido de declaração de inconstitucionalidade da inelegibilidade por exclusão do exercício da profissão por decisão do órgão profissional competente em razão de infração ético-profissional, por oito anos, independentemente de decisão judicial (menos ainda transitada em julgado). O ministro faz ressalva à desproporcionalidade dos oito anos de inelegibilidade cominada após o cumprimento da pena por determinados crimes, propondo que seja considerado o período entre a condenação e o trânsito em julgado da sentença.  Fala, ainda, em necessária flexibilização do princípio da presunção de inocência em matéria eleitoral. Alega que a previsão constitucional de lei complementar sobre inelegibilidades, com os bens jurídicos a serem protegidos, autoriza hipóteses sem o trânsito em julgado. O relator utilizou-se da ponderação e da proporcionalidade e afirmou que declarar inconstitucional a lei seria afrontar a "própria democracia à custa do abuso dos direitos políticos". O Ministro Joaquim Barbosa pediu vista e suspendeu-se o julgamento.
Temo por essa leitura iniciada pelo Ministro Fux. A inelegibilidade pode ou não ser uma sanção, mas nas modificações trazidas pela Lei Complementar nº 135 sempre estamos diante de inelegibilidades sancionatórias, decorrentes de condutas socialmente reprováveis. Assim, me parece de todo inconcebível afastar a exigência, em qualquer caso, de decisão judicial e transitada em julgado. Menos ainda deve ser aceita a possibilidade de atingir fatos anteriores a sua entrada em vigor. Os direitos políticos são direitos fundamentais e sua restrição deve ser justificada não só perante a vontade democrática mas também em face da Constituição, sob pena de entornarmos o constitucionalismo no caldo majoritário (e neste caso, assinale-se, nem isso pode ser efetivamente afirmado). Se assim não for, não há justificativa para o controle de constitucionalidade.
Se hoje, a partir de uma visão perfeccionista da política e dos políticos (mas não do eleitor, tido como incapaz), o Supremo Tribunal Federal permite uma ponderação da moralidade com o Estado de Direito, pouco restará para a proteção das garantias constitucionais.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ótima crítica Eneida!
Parabéns,
Carlos L. Strapazzon

Ana Paula Dias Lorenzetti disse...

Professora, após muito refletir, concordo com a necessidade do transito em julgado da sentença condenatória. A exclusão judicial só pode ser aceita ao fim de um processo com amplo direito à defesa, ao contraditório. Caso contrário,a exclusão deve ser feita pelo eleitor.
Ana Paula Dias Lorenzetti